"Tolerância zero
Em seus desdobramentos individuais e coletivos, a intolerâncioa é o tema comum na diversidade de atrações da 29ª Mostra Internacional de Cinema em São PauloPor Graziella Beting
O que pode existir em comum entre cineastas tão diversos como o alemão Dennis Gansel, o dinamarquês Lars von Trier e o português Manoel de Oliveira? Em que pesem as diferenças de origem e de técnicas cinematográficas, cada um deles mostra a preocupação de traduzir em imagem e narrativa as várias faces da intolerância de nossos tempos. É o que pode ser visto em seus filmes mais recentes, atrações da 29ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Mas o tema não está restrito às produções de maior evidência e é recorrente em grande parte dos 200 filmes e dezenas de curtas-metragens da mostra, que retratam as pressões sofridas pelo homem contemporâneo e suas estratégias para enfrentar, além de seus próprios medos, a família, o grupo ou o Estado — em uma palavra, o outro.
Não é de hoje que a intolerância está associada ao cinema — ao contrário, remete a sua própria origem. Por conta de O Nascimento de uma Nação (1915) — o primeiro longa-metragem da história — D.W. Griffith foi acusado de racismo numa narrativa épica sobre a América e a fundação da Ku Klux Klan. Para tentar se defender das críticas, lançou no ano seguinte um filme intitulado, justamente, Intolerância. Seu objetivo foi mostrar, em quatro histórias, que o conflito com o outro, com o diferente, sempre esteve presente na história: na queda da Babilônia, na crucificação de Cristo, no Massacre de São Bartolomeu e na discussão contemporânea sobre a pena de morte.
Obviamente, há uma grande diferença entre Intolerância e a reflexão que aparece nos longas exibidos pela mostra deste ano. Como pregava o subtítulo do épico de Griffith, para o cineasta a intolerância era a “batalha do amor através dos tempos”. Hoje a intolerância assumiu outras facetas, e mudaram as maneiras de retratá-la. Existem as mais tradicionais, como a de Gansel, que volta à Alemanha nazista em Napola para contar a história de FriedrichWeimer. Ele é um jovem que, contra a vontade dos pais, se inscreve numa das escolas (as napolas) criadas pelo regime para preparar a futura elite do país. O que parecia promissor, aos poucos mostra-se cruel: os estudantes são submetidos ao autoritarismo e à violência psicológica de professores e oficiais.
De maneira diversa, e só para citar outro exemplo, há a exploração das mesquinharias humanas em Manderlay, de Lars von Trier, filme que dá continuidade a sua trilogia sobre os Estados Unidos iniciada com Dogville. E em muitos outros casos, a intolerância aparece em conflitos de grupo que refletem grandes questões contemporâneas, ou, ao contrário, até mesmo em histórias mais subjetivas ou pertencentes à vida privada. Para dar conta dessa diversidade, BRAVO! preparou quatro roteiros com produções que serão apresentadas ao público em 12 salas da capital paulista. Na edição impressa, estão as diferentes maneiras de discutir — e buscar compreender — a opressora atmosfera de intransigência que tomou conta do planeta e de nossas vidas."
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